Burning Down The House: Talking Heads And The New York Scene That Transformed Rock

Francisco Pereira

Jonathan Gould

Burning Down the House chega como o retrato definitivo dos Talking Heads, cinco décadas após a sua formação. Gould, historiador da música e ex-baterista, traça o percurso desde o ambiente inóspito do CBGB e as origens artísticas dos membros — três estudantes de escola de arte com uma guitarra nervosa, um baixo firme e uma atitude intelectual — até se afirmarem como um fenómeno capaz de reconectar o rock com o universo artístico e alternativo de Nova Iorque.

O livro não se limita à biografia. Gould constrói um retrato denso e vivíssimo do cenário da cidade: uma Manhattan em crise, isolada pelo caos urbano, mas fértil em criatividade, onde a confluência entre arte, música e cultura alternativa foi o combustível da revolução sonora da banda. É esse momento cultural — mais do que o trio em si — que ganha protagonismo: a negritude musical, as tensões sociais, a economia precária e o espírito de rua são todos personagens desta história.

A narrativa distingue-se também pela análise do génio (e às vezes excentricidade) de David Byrne. Gould inclui a influência do seu possível Asperger — que moldou a sua atenção obsessiva e estilo de criação sem filtro — sem reduzi-lo apenas a isso, revelando antes um artista omnívoro, inquieto, que incorporou ritmos africanos, funk e latinos num corpo sonoro novo para o rock.

À medida que a banda amadurece — com a adição de Jerry Harrison e a produção de Brian Eno —, Gould pinta o tremendo salto qualitativo que sofreu a sua música: de punk arquejado à polirritmia funk, de introspeção a explosões teatrais emocionais, culminando em momentos icónicos como os álbuns Remain in Light, Fear of Music e concertos como Stop Making Sense, cuja estética performativa escapou conscientemente ao modelo do rock autêntico.

O ritmo do livro pode ser exigente — há quem reclame o seu carácter quase enciclopédico — mas é precisamente essa profundidade que o torna apaixonante para quem queira compreender o que fez dos Talking Heads não só uma banda, mas uma viragem no rock e na cultura popular.

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