Good Pop, Bad Pop

Francisco Pereira

Jarvis Cocker

Um mergulho nostálgico e inventivo nos bastidores de uma mente criativa fora do comum

Jarvis Cocker, figura icónica da britpop e vocalista dos Pulp, poderia ter escrito uma autobiografia tradicional, só que isso não faria jus ao seu íntimo. Em vez disso, oferece-nos Good Pop, Bad Pop, uma obra que foge a todas as convenções, organizada como um inventário do seu sótão. Neste espaço físico e simbólico, Cocker reencontra o passado, não em grandes eventos ou datas marcantes, mas através dos objetos que coleccionou ao longo da vida.

O livro é estruturado como uma sucessão de entradas sobre objetos aparentemente banais: um frasco de colónia, rascunhos de letras, uma caixa de cereais. Cada item é o ponto de partida para reflexões sobre identidade, criatividade e a formação cultural de Cocker — ou seja, uma autobiografia construída a partir das margens, através dos resíduos do quotidiano. Esta abordagem transforma o ato de arrumar em algo quase filosófico: que memórias guardamos e porquê?

O poder simbólico das pequenas coisas

Há algo profundamente empático e até poético na forma como Cocker investe valor nas coisas esquecidas. Os objetos funcionam como portais para episódios da sua infância em Sheffield, da juventude punk e dos anos antes da fama. Através destes fragmentos, somos convidados a rever a nossa própria história, questionando o que é “lixo” e o que é “tesouro”. É um exercício de memória íntima que ressoa com qualquer leitor que já se tenha perdido numa caixa de recordações.

Estilo, humor e visão crítica

Escrito com o humor seco e irónico que lhe é característico, Good Pop, Bad Pop mostra que Cocker continua a ser um excelente contador de histórias, agora em formato prosa. A sua escrita é ritmada, inteligente e muitas vezes inesperada. Tal como nas suas canções mais memoráveis, o tom oscila entre o confessional e o satírico. Mas o livro não é apenas entretenimento: é também uma meditação sobre cultura popular, pertença e classe, onde fica claro que a criatividade não nasce apenas nos grandes centros, mas muitas vezes nos lugares esquecidos.

Uma obra sobre cultura e identidade

No fundo, Good Pop, Bad Pop é um ensaio visual e emocional sobre como nos construímos a partir do que consumimos, vestimos, ouvimos e guardamos. É um manifesto discreto a favor do “mau gosto” e da cultura pop que moldou gerações — e, sobretudo, um lembrete de que mesmo os pedaços mais humildes da vida podem ter um valor imenso quando vistos com o olhar certo.

Capa do livro Good Pop, Bad Pop de Jarvis Cocker sobre um fundo de objetos antigos
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