O novo filme de David Mackenzie, finalmente nas salas portuguesas, acompanha Riz Ahmed no papel de Ash, um profissional especializado em servir de ponte entre denunciantes e entidades que querem pagar por documentos, provas ou segredos. A sua ferramenta principal é um sistema de chamadas “relay”, pensado originalmente para pessoas surdas comunicarem através de um operador. Aqui, o mesmo mecanismo transforma-se num escudo de anonimato: Ash recebe, traduz, encaminha, e ninguém fica a saber quem está do outro lado.
A situação altera-se quando aparece Lily James como Sarah, uma cientista que descobriu algo que compromete uma grande empresa e procura uma forma segura de divulgar a informação. A dinâmica entre os dois é construída com calma: ele tenta manter o distanciamento profissional, ela percebe rapidamente que depende dele para sobreviver às consequências do que descobriu. A relação não se transforma num romance improvisado — continua sempre assente na desconfiança e na necessidade.
Grande parte de Relay aposta numa estética contida: salas escuras, planos fechados, diálogos quase sussurrados. Mackenzie filma como quem quer mostrar o que acontece quando tudo depende do silêncio e da precisão. A tensão vem mais da espera do que da ação — e isso resulta durante boa parte do filme.
É no último ato que o tom muda. Relay acelera, introduz cenas de perseguição e abruptamente troca a contenção por um desfecho mais agitado. A mudança não arruína o filme, mas quebra o equilíbrio que tinha sido construído. A sensação é a de que Mackenzie tentou reforçar o impacto final, mesmo que isso signifique abandonar a lógica mais discreta que dominou o resto da narrativa.
A comparação com o trabalho anterior do realizador surge naturalmente. Filmes como Hell or High Water mostraram uma mão mais segura na construção de tensão emocional e moral. Relay recupera parte dessa abordagem, mas não chega ao mesmo nível de consequência e coesão.
Ainda assim, há mérito na forma como o filme aborda o contacto entre tecnologia, ética e privacidade. A figura de Ash levanta questões interessantes: até que ponto um intermediário que não toma decisões diretas pode ser responsável pelo desfecho das histórias em que participa? E como é que a proteção de um denunciante se transforma, por vezes, em manipulação involuntária?
Relay pode não ser o pico da carreira de Mackenzie, mas tem um conceito forte, boas interpretações e um olhar curioso sobre o lado menos glamoroso do ativismo digital — aquele onde a coragem depende tanto de quem denuncia como de quem faz a ligação sem deixar rasto.











