De vez em quando aparece um filme que nos lembra porque é que ainda vale a pena sair de casa e ir ao cinema. “One Battle After Another”, o décimo filme de Paul Thomas Anderson, é um desses casos raros: ambicioso, brutal, e profundamente enraizado no presente. Ao contrário de muitos dos seus pares, que fogem do aqui e agora e preferem recriar épocas sem smartphones nem redes sociais, Anderson mergulha de cabeça na América de hoje – uma América de poder descontrolado e paranoia à flor da pele.
Baseado livremente em Vineland de Thomas Pynchon, o filme traz a história para o presente e coloca-nos perante Leonardo DiCaprio como Bob Ferguson, um ex-revolucionário que vive escondido numa pequena cidade do norte da Califórnia. Meio bêbedo, meio high, mas ainda assim um pai dedicado, Bob tenta proteger a filha Willa (a estreante Chase Infiniti) de um passado que insiste em bater à porta. Juntos vivem sob identidades falsas desde que o grupo de resistência a que pertenciam – os French 75 – foi desmantelado após a captura de Perfidia (Teyana Taylor), mãe de Willa.
O filme começa em alta rotação, com a libertação de um centro de detenção de imigrantes na fronteira, uma sequência tão intensa que marca o ritmo. Dali em diante, Anderson conduz-nos por uma espiral de violência, perseguições e traições, sempre com a sensação de que cada pequena vitória é apenas temporária. O grande antagonista é o coronel Lockjaw (Sean Penn), que aqui deixa de ser uma figura ambígua para se tornar uma encarnação pura do poder mais cruel e racista. Não há nuance: ele é o sistema, é a máquina, e está disposto a fazer tudo para esmagar quem lhe faz frente.
Há momentos de humor negro, típicos de Anderson, mas o tom é de guerra aberta. O filme não foge às cenas mais duras mas encontra espaço para pequenos retratos de ternura, como as conversas entre Bob e Willa sobre um futuro que pode nunca chegar. É esse equilíbrio entre o épico e o íntimo que faz de “One Battle After Another” algo maior do que um simples thriller político.
A banda sonora de Jonny Greenwood, colaborador de longa data do realizador, é omnipresente e quase física: pulsa, pressiona, dá-nos a sensação de que o perigo está sempre a poucos passos. Cada set piece é marcada pela música de forma a intensificar o impacto emocional, transformando o filme numa experiência sensorial.
“One Battle After Another” é um grito de alerta e um lembrete de que as guerras ideológicas não são coisa do passado. É cinema de autor com orçamento de blockbuster, algo quase extinto em Hollywood, e só por isso mereceria ser celebrado. Mas vai mais longe: é um dos filmes mais fortes da carreira de Anderson e, desde já, um candidato sério aos Óscares. Resta saber se o público está preparado para enfrentar algo tão cru, tão direto e tão espelhado da realidade.









