Num mundo onde o lucro muitas vezes atropela o lirismo, I Love People chega como uma lufada de ar fresco vintage com sotaque moderno. Cory Hanson, já conhecido pelos seus rasgos psicadélicos com os Wand, decidiu compor este álbum principalmente ao piano, fugindo do habitual excesso de guitarras explosivas. Essa escolha revela um artista em busca de subtileza — mas sem contudo sacrificar a densidade emocional. O resultado é um som que mistura a elegância do Laurel Canyon dos anos 70 com uma estranheza poética bem contemporânea.
Gravado com a mesma equipa responsável por Vertigo (Wand, Robbie Cody, Evan Backer, Evan Burrows), I Love People mantém a química de banda, mas explora outra linguagem. Há uma produção rica, com arranjos de cordas, metais e vocais em harmonia — tudo a brilhar com aquele conforto cinematográfico típico da era dourada do soft rock americano. Só que sob essa camada sedosa há temas pesados disfarçados com suavidade: dissonâncias existenciais, desilusão política, crises de identidade. É um álbum que sussurra críticas sociais envoltas em melodias acolhedoras.
O título é quase uma provocação gentil: “Eu amo pessoas” — um gesto de empatia, mas também uma declaração irónica quando observamos as personagens que Hanson pinta. Homens desiludidos, veteranos sem lugar, figuras marginalizadas que ganham voz num universo narrativo entre melancolia e humor negro. É esse contraste entre o romantismo da ênfase musical e a crueza da letra que torna o álbum tão cativante.
O processo criativo de Hanson parece ter sido uma colagem meditativa do quotidiano americano visto através de lentes nostálgicas e também algo paranoicas. Ele recontextualiza temas como a “war on terror” ou os erros da era política recente, mas de modo oblíquo, metafórico, quase surreal — um modo mais sofisticado de protesto. E é notável como ele equilibra essa poética reflexiva com momentos de leveza contagiante, como no clima saltitante da faixa-título, cheia de trombones e um humor ácido mas convidativo.
No final de contas, I Love People mostra-nos um artista que amadureceu como compositor. Ele tem o tino para narrativa folk-rock, a sensibilidade para produção luxuosa, e a ironia para transformar o cinismo em elegância emocional. É um disco que se saboreia devagar, que revela mais a cada escuta, e que combina brilho estético com um corte filosófico inesperado — bonito, tenso, irreverente.