Luta Livre – Contrafação (2025)

Francisco Pereira

Luís Varatojo regressa com o terceiro álbum do projeto Luta Livre, “Contrafação” — um disco mais íntimo e direto, marcado pela simplicidade, observação e crítica social subtil.

O projecto Luta Livre, comandado pelo veterano português Luís Varatojo, apresentou no passado dia 17 de Outubro o seu terceiro capítulo, intitulado Contrafação, e podemos dizer, desde já, que é ao mesmo tempo um registo de continuidade mas também de viragem. Conforme o próprio Varatojo revela, o disco representa “um processo de simplificação em curso”: partindo de arranjos mais complexos nos álbuns anteriores, o músico opta aqui por uma instrumentação mais contida. Usando apenas guitarra acústica, sintetizadores e a sua voz, Varatojo tenta deliberadamente manter o som cru, directo e sem excesso de adereços.

Se olharmos para o percurso desde o início, vemos que Luta Livre arrancou com Técnicas de Combate (2021) como álbum de estreia, no qual Varatojo experimentava com samplagem – sobretudo jazz –, construindo músicas em pedaços, com várias vozes convidadas e um carácter deliberadamente plural. No segundo registo, Defesa Pessoal (2023), Varatojo faz uma viragem para a guitarra eléctrica, com novos convidados, sendo que o discurso político e social permanece, mais directo e centrado nas dores e contradições da sociedade portuguesa. Agora, em Contrafação, há algo de intimista, numa espécie de balanço que privilegia o “menos é mais” e procura um modo de comunicação mais imediato.

O álbum acaba por reflectir este foco: o músico afirma que, em vez de se debruçar agora sobre temas directamente políticos (como por exemplo, “os preços aumentam” ou “o trabalhador é explorado”, como acontecia no trabalho anterior), ele opta mais por observar comportamentos: o que fomos, como portugueses, e o que somos agora. A opção técnica de gravação em estúdio próprio entre Outubro de 2024 e Maio de 2025, e o facto de Varatojo assumir sozinho a voz e os instrumentos principais reforçam a ideia de um acto mais pessoal, mais próximo, até mais despido. É notória a tentativa de «fazer menos ruído externo» para deixar a mensagem sobressair.

Contrafação vem no momento certo: em tempos em que a “veracidade” da informação, a massificação dos consumos e a sensação de que tudo, desde a política à cultura, se tornou produto, são temas cada vez mais presentes. Podemos chamar de “retratos da realidade” mas efetivamente mostra-nos um reflexo de uma sociedade saturada de “falsificações, fraudes, adulterações de factos”.

Claro está que, este reforço de simplificação também traz os seus desafios: ao afastar os arranjos mais carregados e ao assumir um registo mais contido, o risco é que o impacto imediato fique reduzido para quem esperava o discurso mais contundente dos álbums anteriores. Mas é precisamente aí que reside o mérito do trabalho. Varatojo escolhe não seguir o caminho mais cómodo de barulho constante, mas coloca-se numa zona mais vulnerável, mais ligada à observação do quotidiano em vez de à denúncia directa. Numa frase “a luta continua mas com menos megafone e mais observação”.

Contrafação confirma o que já sabíamos: Luta Livre é muito mais do que uma banda de protesto. É um projeto de transformação, com clareza de propósito e que nos continua a trazer o mais importante da música que é o prazer da escuta.

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