Patrick Watson – Uh Oh (2025)

Francisco Pereira

Patrick Watson apresenta 'Uh Oh', um disco gravado em várias cidades do mundo e que resulta de um período em que o músico perdeu temporariamente a voz.

Uh Oh é o oitavo álbum de Patrick Watson, lançado no passado dia 26 de Setembro através da Secret City Records, e representa um ponto de viragem no seu percurso. O disco chega depois de Watson enfrentar um período grave em que perdeu temporariamente a voz — uma experiência que o confrontou com a possibilidade de nunca mais poder cantar. Em vez de vergar, Watson transformou essa crise numa oportunidade: compôs várias canções para serem interpretadas por outras vozes, criando um álbum de colaborações com artistas cujos timbres admira, ao mesmo tempo que restaura aos poucos a própria voz. Esta escolha não é apenas reativa, mas parece parte de uma evolução na sua prática artística, valorizando o coletivo tanto quanto o pessoal.

O disco foi gravado em vários locais à volta do mundo — Montreal, Los Angeles, Paris, Nova Orleães, Cidade do México — usando uma abordagem minimalista de gravação: muitos temas foram captados em apenas uma ou duas tomadas, com apenas dois microfones, procurando preservar a espontaneidade e a vulnerabilidade. Os músicos de longa data de Watson — Mishka Stein, Olivier Fairfield e a vocalista Ariel Engle (La Force) — formam o núcleo instrumental, mas o álbum é amplamente marcado pelas vozes convidadas, cada uma trazendo algo diferente e complementando a estética introspectiva de Watson com camadas novas de expressão.

Entre essas colaborações, a parceria com a cantora portuguesa MARO destaca-se de maneira particular. A faixa “The Wandering”, gravada em Los Angeles, conjuga uma batida com ressonâncias de bossa nova, arranjos orquestrais sensíveis, e um diálogo vocal em que MARO participa com elegância, adicionando uma melancolia elegante que se alinha com o sentido de deslocamento que Watson vinha a expressar. A gravação foi feita em grande parte numa só tomada, o que acentua essa sensação de intimidade partilhada — Watson comentou que, ao ouvir pela primeira vez a voz de MARO, sentiu algo único, “um tom suave e sedoso” que evoca a melancolia de percorrer as cidades de Portugal. Essa colaboração ajuda não só a dar cor ao álbum, mas a ancorar emocionalmente o tema central de Uh Oh: o reencontro da voz, não apenas como som, mas como presença humana partilhada.

As vozes femininas que atravessam Uh Oh foram escolhidas de forma instintiva, muitas vezes a partir de descobertas fortuitas. Patrick Watson deixou-se guiar pela surpresa de encontrar timbres que o emocionaram e, sem grandes planos, convidou-as a participar. Entre nomes já reconhecidos, como Martha Wainwright ou Charlotte Cardin, surgem também artistas que o impressionaram pela frescura e intensidade — casos de MARO, Solann, Hohnen Ford ou November Ultra — cuja presença acrescenta novas camadas de cor e sensibilidade ao álbum.

Uh Oh constroí-se em coerência apesar das limitações impostas pela adversidade vocal: é um álbum de profundidade e sensibilidade, que evita o drama gratuito. A coexistência entre o íntimo (voz fragilizada, silêncio, vulnerabilidade) e o sonoro mais expansivo (arranjos orquestrais, produção cuidada, texturas eletrónicas subtis) funciona de modo a enriquecer a experiência. Watson mostra que a adversidade, em vez de inibição, pode resultar em expressão renovada e genuína.

No geral, Uh Oh é um trabalho notável na discografia do músico: não apenas por ser uma resposta a circunstâncias difíceis, mas por mostrar que ele consegue converter dor e incerteza em algo artístico e bonito. Este é um álbum que nos recompensa com intimidade, imaginação e uma honestidade que ressoa no nosso conforto.

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