Desde o lançamento de Expert in a Dying Field (2022), os The Beths cimentaram-se como mestres da jangle-pop respirada sob o signo da melancolia calorosa. Com Straight Line Was a Lie, o quarteto de Auckland não reinventa a roda, mas faz algo talvez ainda mais desafiante: altera suavemente o curso da sua identidade musical, mantendo a base melodiosa e o indie-rock vibrante, mas adicionando uma nova dimensão emocional e textural. É uma evolução que respira continuidade, mas aponta para um território mais introspectivo e expansivo.
Este novo álbum é talvez o mais refinado da banda até à data. As guitarras continuam cintilantes e os refrãos irresistíveis, mas tudo soa agora mais polido, pensado e calibrado. A produção — assinada por Jonathan Pearce — está mais meticulosa, revelando uma riqueza instrumental que recompensa audições atentas e repetidas. A escrita de Elizabeth Stokes, por sua vez, mergulha mais fundo: há vulnerabilidade crua nas reflexões sobre estado emocional, relação com o eu e tentativa de seguir em frente durante o uso de antidepressivos. O disco parece construído como uma conversa consigo mesma, partilhando dúvidas, desconfortos, redescobertas e, acima de tudo, aceitação.
Não faltam momentos em que o disco se permite ser expansivo e existencial: há canções que falam de natureza, medicalização, vínculos familiares e sensação de desconexão — tudo envolto na sonoridade alegre e retro que caracteriza a banda. É essa justaposição — tristeza disfarçada de brilho pop — que torna Straight Line Was a Lie tão poderoso. A sensação de ver a vida num ciclo que nos exige reinvenção constante, em vez de progresso linear, atravessa o álbum como um fio condutor e confere-lhe coerência emocional.
A fórmula jangle continua a funcionar — aguda, precisa e infalível —, agora aliada a letras mais honestas e amadurecidas, e a composições que convidam tanto à celebração da melodia quanto à introspeção. É uma obra que mostra os The Beths entregues ao seu ofício com confiança renovada, sem perder um grama da sua essência.
No final, Straight Line Was a Lie é, acima de tudo, um disco de reconciliação com os próprios altos e baixos. É uma oferta que consegue ser poderosa e suave, confessional e acessível, inquietante e oferecida com um sorriso. Os The Beths mostram que crescer como artistas não implica perder a alma — antes alarga o seu campo sensorial, mantendo o coração a bater no centro do som.
* fotografia de Amanda Cheng