Entrevista aos Nation of Language: preparados para dar tudo no concerto de amanhã no LAV.

Tiago Castro

Na véspera do aguardado concerto dos Nation of Language em Lisboa, Ian Devaney falou connosco à hora de almoço sobre o novo álbum Dance Called Memory — um disco nascido da perda, moldado pela terapia sonora e agora vivido com intensidade na recta final da digressão europeia.

Entre o eco dos concertos de Itália e Espanha e a expectativa do fecho emotivo no LAV, o vocalista revela como as novas canções ganham corpo em palco, como a Sub Pop entrou naturalmente na história da banda e como a harmónica, os sintetizadores e o espaço entre as notas ajudam a contar a memória física das emoções. Amanhã, no Lisboa ao Vivo, promete-se entrega total.

Entrevista por Tiago Castro

É 01h da tarde e ligámos a Ian Devaney, voz e guitarra em Nation of Language, para uma breve entrevista de antecipação ao concerto de 6ª Feira em Lisboa, em nome próprio, no LAV.

A banda de Brooklyn está a finalizar a digressão europeia de apresentação a Dance Called Memory, o novo disco lançado em Setembro. E apesar da enorme sensibilidade pop e ritmos dançáveis que têm marcado o percurso dos Nation of Language, o quarto álbum do trio nova-iorquino nasceu de um lugar de dor e de perda. Nesta entrevista percebemos um pouco do universo sónico deste disco, de como correu o processo de gravação em estúdio e depois como se alinham os novos temas para dialogarem com os dos álbuns anteriores em cima do palco.

Mente Cultural – Os Nation of Language estão neste momento a terminar a presente digressão de apresentação do álbum Dance Called Memory. O último concerto foi em Itália, em Milão. Hoje e amanhã em Espanha e na 6ª em Lisboa. Como tem corrido a digressão, como foi em Milão e como o público tem recebido as novas canções?

Ian Devaney – A tour tem corrido muito bem e é sempre óptimo tocar em Itália, tem um público muito efusivo. E no geral, o público tem reagido bem às novas canções. E de forma surpreendente até já cantam as letras dos novos temas, o que sabe sempre bem.

MC – O novo disco é o vosso primeiro a sair por uma editora história, a Sub Pop. Como surgiu este envolvimento com a label e como tem sido trabalhar com a equipa da Sub Pop?

ID – Surgiu de forma muito natural. Seattle para nós sempre foi um local de onde veio muita música boa e quando passava na rádio algum nome de Seattle ficávamos muito atentos. Sempre tivemos muito apoio da editora anterior (PIAS Recording) mas ficámos muito felizes com o convite da Sub Pop. É um selo importante, com história e fez sentido neste momento da carreira.

MC – Li nas vosses redes sociais que este disco nasceu de um período de perda e de uma série de percalços de vida. Como levaram esses momentos para a música?

ID – Estávamos a preparar o novo disco e de facto pensámos muito em como o álbum ia ser recebido pelas outras pessoas. Porque é uma viagem terapêutica daquilo que experienciei nos últimos anos. E tenho a sorte de estar rodeado por uma banda que me apoia e também a sorte de ter música à minha volta. Acredito que a música tem esse efeito terapêutico e que quem sofre de depressão pode pegar na guitarra por exemplo e tocar e encontrar na música um refúgio. Nunca se sabe o que pode surgir quando se começa a tocar.

MC – Como foi trabalhar novamente com Nick Millhiser como produtor?

ID – Já tínhamos trabalhado com ele antes e também gostamos muito da banda dele, os Holy Ghost. E é sempre um processo de descoberta, de novos sons e de novas soluções. Trabalhar com o Nick não é fazer uma “check list”, como: gravar o baixo, “check”; gravar a guitarra, “check”. É mais a busca do que serve melhor a canção.

MC – Um dos grandes desafios de uma banda em estúdio acaba muitas vezes por decidir o que retirar a uma canção, já que pode gravar e voltar a gravar arranjos de uma forma que não acontecia décadas atrás. E senti ao ouvir o disco também quase uma abordagem minimalista. Também passaram por isso, pela questão de “less is more”?

ID – Sim, de certa forma foi isso que aconteceu. Perguntávamos muitas vezes “faz sentido colocar mais alguma coisa na canção?”. Às vezes quando começamos a gravar mais instrumentos, acabamos por retirar à canção aquilo que a tornou fixe no início. Por isso parámos e perguntámos “qual o elemento mais importante da canção e como o podemos trazer ao de cima”.

MC – Muitos sintetizadores, guitarras ao longo das canções, mas o álbum começa com um instrumento muito orgânico, a harmónica na canção “Can’t Face Another One”.

ID – Sim, com essa canção quis captar uma sensação de espaço. Há uma banda paralela dos Slowdive, os Mojave 3, que têm um som dreamy e com a sensação que estão num deserto. Há muito espaço, emoção e há sensação de solidão. Quis captar esses sentimentos com a música que abre o disco. E para mim nada reflecte mais esse feeling quase de Western do que uma harmónica.

MC – E como surgiu o título para este disco, Dance Called Memory?

ID – Foi retirado de um livro de poesia, da poeta Anne Carson, que se chama The Beauty Of The Husband.
Tento sempre que o título do álbum venha de alguma letra das canções, mas não estava a encontrar nada que resumisse o estado de espírito do disco. E a Aidan, como ávida leitora que é, tinha este livro e passou-me com uma linha sublinhada… Dance Called Memory. E aquilo foi ficando e estava sempre a recordar aquela frase. Começou a fazer sentido para aquilo que queria dizer com o disco.

Há uma relação muito física com o nosso passado, uma memória física das coisas de que nos lembramos. Às vezes queremos as memórias muito perto, outras queremos empurrá-las para longe. E num disco que fala muito sobre perda e dor,  aquela frase sublinhada pareceu muito apropriada para ser título.

MC – Como foi o processo de alinhar as novas canções juntamente com as antigas para os concertos?

ID – Tem sido um processo suave. No passado deixávamos as músicas encontraram o seu espaço nos concertos à medida que a digressão decorria. Íamos experimentando o que resultava melhor ou não. Para este disco antecipámos isso e pensámos logo como os novos temas resultariam ao vivo, sem querer também tocar tal e qual como no álbum. Há momentos em que tiramos elementos, noutros colocamos outros arranjos. Assim que arrancámos a digressão, as novas canções sentiram muito naturais entre as restantes.

MC – Já passaram antes por Portugal. Que memórias guardam?

ID – Foi sempre bom. Já passámos um par de vezes por Portugal e adorámos. Tocámos no Primavera Sound no Porto e foi dos melhores concertos em festivais que já tocámos. O público, se calhar até sem nos conhecer muito bem, deu muito de si, com muita excitação. Houve uma grande troca de energia com o público. Acabámos a digressão em Portugal, no Porto e foi tudo muito louco.

MC – E o que podemos esperar esta 6ª Feira?

ID – Vai ser o último concerto desta digressão, vai ser excitante e emocionante. Estamos preparados para dar tudo no palco, não há razões para suster o que quer que seja.