Fernanda Torres brilha neste drama que tem conquistado o público em todo o mundo e que está a caminho dos Óscares.
Comecemos pelo óbvio, pela razão principal que tem levado milhares de espectadores a esgotarem as salas de cinema em Portugal: Fernanda Torres, vencedora do Globo de Ouro para Melhor Atriz em Drama e nomeada para o Óscar de Melhor Atriz Principal. O filme fez história no Brasil ao ser, ainda, duplamente nomeado para o Óscar de melhor filme e melhor filme internacional.
Fernanda domina o ecrã com uma performance que é um soco no estômago e um abraço ao mesmo tempo. A sua entrega faz-nos esquecer que estamos, simplesmente, a assistir a um filme; parece que estamos a ler o diário íntimo de alguém que sobreviveu a uma guerra silenciosa. Ela é crua, real, mas também cheia de nuances que só uma atriz do seu calibre pode oferecer.
Fernanda Torres não interpreta, encarna. Em Ainda Estou Aqui, ela é uma explosão contida, num filme, dirigido com um olhar intimista, que traz uma narrativa, baseada numa história real, que aborda o trauma coletivo da ditadura militar brasileira.
O enredo é simples na superfície: uma mulher revisita sua casa de infância, mas o que encontra são assombrações — não só as do lugar, mas as suas próprias. A ditadura, aqui, é mais do que um contexto histórico; é um personagem invisível que molda, cala e rasga vidas. Como a do seu marido, que é levado pela polícia militar, sem qualquer tipo de justificação para nunca mais regressar à sua família. A forma como o filme resgata as marcas do regime militar, especialmente nas relações familiares, é brutalmente honesta, mas nunca panfletária.
E o que dizer da banda sonora? É uma outra protagonista, capaz de nos arremessar para dentro das emoções da atriz. São canções que misturam a melancolia de um Brasil sufocado pela repressão com a suavidade de momentos quase etéreos. Uma mistura de clássicos da MPB e composições originais que parecem pulsar no mesmo ritmo do coração da protagonista.
Se Ainda Estou Aqui fosse uma pessoa, seria aquele amigo que te serve um copo de vinho e te faz rir antes de te contar verdades difíceis. É um filme que te faz pensar, sentir e, acima de tudo, lembrar. Porque esquecer, como nos lembra Fernanda com o olhar perdido numa memória qualquer, nunca é uma opção.