A onda de artistas pop e indie migrando para o country tem sido, nos últimos anos, tão previsível quanto a febre de sintetizadores nos anos 1980 ou a obsessão por trap em meados dos 2010. Beyoncé, Post Malone e até mesmo Lana Del Rey embarcaram nessa viagem, alguns com mais legitimidade do que outros. Julien Baker e Mackenzie Scott (TORRES), no entanto, evitam os clichês fáceis em Send A Prayer My Way, entregando um trabalho que se apropria do género sem cair no pastiche ou no oportunismo.
Devemos começar por elogiar a subtileza com que Baker e TORRES incorporam elementos do country, tratando-o como uma extensão orgânica de suas carreiras, e não como um disfarce temporário. De facto, faixas como “Sugar In The Tank” e “Tape Runs Out” evitam os exageros do género, optando por uma melancolia contida que lembra mais o slowcore de Jason Molina do que os hits de Luke Combs.
O disco brilha quando mergulha em temas LGBTQ+, como em “Tuesday”, onde TORRES narra com crueza a rejeição religiosa de uma mãe conservadora. A linha “tell your mama she can go suck an egg” é tão cáustica quanto catártica, e momentos como esse mostram como o country, historicamente associado ao conservadorismo, pode ser subvertido. No entanto, algumas letras, como as de “No Desert Flower”, roçam o lugar-comum, com metáforas sobre resistência que soam mais como slogans do que como poesia.
A combinação vocal entre Baker (frágil, angustiada) e TORRES (aterrada, visceral) é um dos maiores trunfos do projeto, especialmente em harmonias como as de “Dirt”. Há momentos em que suas vozes, belas, parecem coexistir sem verdadeiramente se fundir, como se estivessem em camadas separadas. Contudo, apesar de parecer que cada uma canta a sua própria dor, acabam por encontrar um ponto de convergência emocional.
Send A Prayer My Way não é um disco revolucionário, nem pretende ser. É um trabalho sólido, repleto de momentos de beleza crua, e que pode porventura sofrer precisamente por ser tão bem comportado. Enquanto que Beyoncé abraçou o country com ousadia e provocação em Cowboy Carter, Baker e TORRES optam por uma abordagem mais introspectiva.
O álbum é (mais) uma prova de que ambas são artistas talentosas, capazes de se reinventar e sem perder a sua essência.